A Ancine (Agência Nacional do Cinema) está envolvida em decisões controversas para regulamentar o conteúdo audiovisual na internet brasileira. Ela recentemente propôs que serviços de streaming, como a Netflix, tenham cota mínima nacional e paguem um imposto à agência.
E, esta semana, surgiram rumores de que a Ancine simplesmente decidiu cobrar imposto sobre GIFs. É uma ideia absurda que acabou sendo levada a sério. O boato é falso, mas como ele surgiu?
Um post no Facebook diz que “todos os conteúdos audiovisuais de marcas (GIFs, vídeos de influenciadores nos canais deles, nos canais da marca etc.) na internet terão que pagar Condecine”. A fonte é a Instrução Normativa nº. 134, publicada em 9 de maio; no entanto, o documento da Ancine não menciona GIFs.
O post também menciona uma análise feita por Mateus Basso, da APRO (Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais), que publicamos na íntegra no final do post; ela também não menciona GIFs.
Essa informação acabou sendo levada para um blog de um analista de mídias sociais. O artigo, com uma imagem bem compartilhável, está viralizando no Facebook.
A IN 134 vai regulamentar vídeos de propaganda na internet. As regras valem para peças publicitárias que sejam divulgadas por canais oficiais — o perfil de uma marca no Facebook ou o canal dela no YouTube, por exemplo.
A Ancine esclarece, por meio de nota, que a IN 134 não tem nada a ver com GIFs:
A IN 134 trata de obras audiovisuais publicitárias. Apenas devem recolher CONDECINE obras audiovisuais publicitárias veiculadas na internet. Não há incidência do tributo sobre as demais obras audiovisuais veiculadas na internet.
Ainda sobre isso, a ANCINE estabelece que, para ser considerada obra audiovisual, o conteúdo precisa ser produzido para reprodução a no mínimo 23 quadros por segundo (fps). Desta forma não incidirá CONDECINE sobre conteúdos que sejam produzidos com um número de quadros por segundo abaixo de 23, categoria em que se encaixam a vasta maioria dos GIFs animados, bem como banners em outras tecnologias.
É o mesmo que diz Sonia Regina Piassa, diretora executiva da APRO, ao Tecnoblog. Ela lembra que a IN 134 trata de conteúdo “produzido para comunicação pública a 23 (vinte e três) quadros por segundo, no mínimo” — isso não engloba os GIFs, mesmo que façam propaganda de uma marca.
Histórico
A análise da APRO diz que a IN 134 faz “a reinclusão da internet enquanto segmento de mercado”. Conversamos com Sonia por telefone para entender melhor o que isso significa.
A Ancine foi criada em 2002 e estabeleceu a cobrança da Condecine para anúncios veiculados em todo tipo de mídia, como TV, cinema e “outros mercados” — categoria que engloba outdoors, banners, propaganda em avião e também a internet.
Sonia explica que, por volta de 2006, a associação entrou em acordo com a Ancine para que propagandas online não pagassem a Condecine, já que a agência não tinha como fiscalizar esse meio, e porque começaram na época as discussões para definir o Marco Civil da Internet.
Com o passar do tempo, as propagandas em vídeo na internet se multiplicaram, mas a Ancine não recebeu o imposto por isso. Ela não tem ideia precisa do tamanho desse mercado — nem mesmo o registro dessas peças publicitárias era obrigatório.
Isso muda com a IN 134. Ela estabelece que toda obra audiovisual publicitária deve ser registrada na Ancine, inclusive se for veiculada apenas na internet. O registro exige documentos como a cópia do contrato de produção, a cópia da nota fiscal da produtora, entre outros.
E, dependendo do caso, será preciso pagar a Condecine. Sonia explica que obras de pequenas empresas são isentas, assim como peças com orçamento de até R$ 10 mil; acima disso, é preciso seguir os valores desta tabela. Por exemplo, para uma obra publicitária gravada no Brasil, a taxa é de R$ 300,25 (ela segue os valores da categoria “outros segmentos de mercado”).
Sonia também esclarece que vídeos patrocinados por uma marca não serão regulados pela IN 134, nem mesmo merchandising em vídeos online — essas regras valem apenas para peças publicitárias. Além disso, caso seja cobrada a Condecine, ela é paga pela agência ou empresa responsável, não pelo canal que o veicula.
Apesar de pegar alguns de surpresa, o projeto da IN 134 ficou em consulta pública durante um mês, entre agosto e setembro de 2016. Ela entra em vigor no dia 18 de julho.