A mineração de bitcoin (BTC) na Argentina se tornou uma opção muito atraente em meio à economia deteriorada e inflação elevada. Além disso, a política intervencionista do governo argentino de Alberto Fernández, principalmente durante a pandemia, subsidiou indiretamente a atividade ao baixar os preços da energia elétrica no país. Agora, o país vizinho caminha para se tornar o maior minerador de criptomoedas de toda a América Latina.
Especialistas que conversaram com a Bloomberg acreditam que os mineradores estão se beneficiando dos subsídios governamentais para aumentar sua capacidade de produção. Mesmo com o bitcoin em baixa, a relação de custo da energia elétrica com os ganhos potenciais ainda é muito vantajosa, principalmente diante do peso argentino em colapso.
Para Nicolas Bourbon, um especialista em mineração de criptomoedas de Buenos Aires, esse recente fenômeno reflete a capacidade dos argentinos de dobrar políticas governamentais a seu favor. “Mesmo após a correção do preço do bitcoin, o custo da eletricidade para quem está minerando em sua casa ainda é uma pequena fração da receita total gerada”, disse ele.
Criptomoedas ajudam a evitar o peso desvalorizado
As criptomoedas são um assunto crescente na Argentina nos últimos anos. Com o agravamento da inflação ainda no governo Macri, os argentinos que tinham condições financeiras converteram seus pesos para dólares. Porém, essa situação gerou outro problema no país. A reserva nacional da moeda estrangeira começou a ficar escassa, ameaçando ainda mais a estabilidade financeira, o que levou a decisões mais drásticas.
Na segunda metade de 2020, os argentinos se viram com uma cota mensal para a compra de até US$ 200 imposta por pessoa física. Essa restrição também inclui gastos em cartões de crédito internacionais, por exemplo. A venda em massa de pesos prejudicou ainda mais seu preço e a altíssima demanda pela moeda americana agravou a inflação que, segundo os dados mais recentes, gira em torno de 4% ao mês, acumulando mais de 46% no ano passado.
Foi nesse momento que as criptomoedas chamaram a atenção. Devido a sua natureza descentralizada e tendência deflacionária, a demanda que antes se voltava ao dólar foi direcionada principalmente ao bitcoin (BTC) e ether (ETH) como reservas de valor após a população sofrer com três anos de recessão. A situação econômica somente se agravou durante a pandemia de COVID-19 e as inadimplências e falências se tornaram comuns.
Mineração de bitcoin se torna muito lucrativa no país
A mineração de criptomoedas então se tornou uma alternativa muito atrativa para gerar renda. A demanda por bitcoins, por exemplo, cresceu absurdamente nos últimos meses, criando até mesmo um mercado paralelo de comércio de moedas digitais fora de exchanges regulamentadas, operando com preços inflados. Enquanto a conversão oficial de 1 BTC para pesos argentinos gira em torno de 3,4 milhões, o ativo era negociado por quase 6 milhões no câmbio não oficial no último domingo (30), de acordo com a Bloomberg.
Ezequiel Fernandez, analista na Balanz Capital Valores em Buenos Aires, disse que, por mais que o país seja um importador de combustíveis para gerar energia elétrica, as contas que chegam para o consumidor geralmente refletem apenas 2% ou 3% de sua renda média mensal. Como comparação, esse percentual no Brasil, Colômbia e Chile pelo menos duas vezes maior. “As criptomoedas que os mineiros geram são normalmente vendidas a taxas de câmbio paralelas, mas a energia é paga sob um valor subsidiado”, disse Bourbon. “No momento, as receitas geradas são muito altas”. Dessa maneira, a Argentina está se tornando um polo muito lucrativo para a mineração de ativos digitais.
Oportunidade desperta interesse de empresas estrangeiras
As empresas dedicadas à atividade já estão percebendo a oportunidade de negócio. No mês passado, a canadense Bitfarms disse que fechou um acordo para acessar diretamente uma usina de energia local para extrair até 210 megawatts de eletricidade movida a gás natural. Uma vez concluída, a operação poderia criar a maior instalação de mineração de bitcoin de toda a América do Sul.
“Estávamos procurando locais que não usam todos seus sistemas de geração de eletricidade”, disse o Presidente da Bitfarms, Geoffrey Morphy, em uma entrevista à Bloomberg. “A atividade econômica na Argentina está baixa e a energia não está sendo totalmente utilizada. Portanto, é uma situação vantajosa para ambas as partes.”
Porém, os subsídios governamentais não são tão amplos para o setor industrial que a Bitfarms se enquadra. Mesmo assim, o preço de US$ 0,022 por quilowatt-hora que a empresa diz que vai pagar pela eletricidade argentina está muito abaixo da taxa média de mercado de US$ 0,06 por quilowatt-hora, de acordo com Fernandez de Balanz Capital.
“Para certas empresas de energia com fácil acesso a gás, vender eletricidade excedente para mineradores de bitcoin durante parte do ano faz sentido, especialmente se elas, de alguma forma, evitam os controles de câmbio ao receber em dólares fora da Argentina, ou até mesmo em bitcoin”, concluiu.
Com informações: Bloomberg