Assim como os processadores para computadores, os chips que equipam celulares evoluem a cada ano, apresentando mais recursos com o uso de componentes de tamanhos cada vez mais diminutos.
Ao longo dos últimos anos, esses chipsets ganharam uma série de atribuições. Hoje, eles abrigam, além da unidade central de processamento (CPU), o chip gráfico (GPU) e o modem para conexões de dados móveis.
Paralelamente a essa evolução, surgiu a necessidade de reduzir as dimensões do processador, já que os smartphones estão cada vez mais de finos e necessitam componentes eletrônicos compactos.
Não só isso, as empresas responsáveis pelo desenvolvimento das arquiteturas levaram os recentes chipsets a patamares incríveis em questão de consumo energético. Em teoria, tudo isso é muito bacana para o consumidor, mas será que as coisas funcionam da forma esperada no dia a dia?
Conforme alguns sites vêm reportando, o mais novo chip top de linha da Qualcomm, que equipam uma grande gama de aparelhos famosos, estão apresentando alguns problemas de temperatura e desempenho. Vamos entender o que exatamente está acontecendo e tentar descobrir o culpado por esses problemas que afetam diretamente o usuário final.
Entenda o problema
De acordo com postagens no Reddit, Phone Arena, AnandTech e ArsTechnica, o Snapdragon 810 está sendo mais uma decepção do que um grande avanço para a fabricante. Ainda que ele seja mais rápido do que os antecessores, sua temperatura pode incomodar os usuários, que percebem facilmente quando o chip chega acima dos 50 ºC.
Além de o componente esquentar a carcaça do celular, sua temperatura elevada acaba prejudicando também na performance geral, caindo num problema de throttling. Esse termo geralmente é utilizado para fazer referência a unidades de processamento que têm seu desempenho reduzido quando há um problema de excesso de calor.
Esse tipo de problema é mais comum do que você imagina, sendo recorrente até mesmo em notebooks e tablets. Acontece que quando há um ciclo contínuo dessas ocorrências de superaquecimento, o usuário acaba percebendo facilmente a lentidão do sistema como um todo. E o Snapdragon 810 está passando justamente por esse tipo de inconveniente.
O mais curioso é perceber que componentes concorrentes não passam pelo menos aperto que o chip da Qualcomm. O Samsung Exynos 7420 trabalha com uma arquitetura similar, trazendo a mesma quantidade de núcleos e chegando até mesmo a frequências mais elevadas, mas não causa desconforto ou problemas graves. E é justamente por isso que a Samsung nem quis criar uma variante do Galaxy S6 com o chip da Qualcomm.
Clock: nem tudo é conforme a propaganda
Antes de qualquer coisa, precisamos pensar sobre essa questão do impacto na performance para o consumidor. Primeiro que muitas pessoas sequer sabem que existem um negócio chamado clock e que isso pode afetar seus aplicativos. Para muitos, o que importa é ter vários núcleos e isso já vai ser suficiente para rodar joguinhos.
Além disso, aqueles consumidores que conhecem um pouco sobre hardware dificilmente vão imaginar que um produto de alto desempenho como LG G Flex 2 ou o HTC One M9 vão passar por esse tipo de situação. Aliás, salvo raras exceções em que a temperatura está muito elevada ou que algum jogo trava muito, é bem difícil identificar um problema no processador.
Normalmente, o consumidor não suspeita do chipset, já que mesmo operando com clock reduzido, o chip tende a atender as necessidades básicas do sistema operacional. Aí, num caso desses, a pessoa tende a culpar o Android. Só que, nesse caso, a culpa não é do sistema da Google, mas sim do projeto da Qualcomm.
Conforme os benchmarks da ArsTechnica, na maior parte do tempo, o Snapdragon 810 está operando com uma frequência bem abaixo daquela publicada em sua ficha de especificações. Em teoria, isso não é um absurdo, já que a fabricante apenas declara que está é o clock máximo do componente, mas acaba sendo uma sacanagem com o consumidor.
Estressando o processador
É bem possível que você esteja se perguntando: oras, mas se nos benchmarks este processador vai tão bem, porque as pessoas estão relatando problemas de desempenho? Bom, acontece que um teste como o do AnTuTu ou do Geekbench não sempre executa tarefas comuns ou que tentem simular a ação do usuário.
Benchmarks sintéticos são capazes de verificar a integridade do componente e sua capacidade de processamento, mas eles dificilmente levam um chipset ao extremo. É nesse quesito que temos a diferença, já que o consumidor vai usar o celular por horas seguidas e rodar um joguinho que muitas vezes foi programado para usar apenas dois núcleos do processador.
Para conseguir levar o chip da Qualcomm ao máximo, a ArsTechnica fez uma série de testes com oGeekbench. Usando a versão mais recente do programa (que pode usar apenas dois núcleos no teste de superaquecimento), eles conseguiram identificar os problemas do novo Snapdragon com facilidade.
Os benchmarks foram rodados em diferentes modelos de celulares e processadores, garantindo resultados mais precisos e que permitam uma comparação do quadro real de desempenho. Graças ao sistema de monitoramento de clock que verifica os truques do processador em intervalos de cinco segundos, foi possível gerar gráficos que permitem identificar as deficiências de cada componente.
Resultados dos testes
Depois de testar vários smartphones, os resultados evidenciariam algumas coisas óbvias, mas outras um tanto curiosas. Primeiro, fica claro que o Nexus 5 (e possivelmente outros aparelhos que usam o Snapdragon 800) apresentam problemas mais graves de desempenho devido ao calor excessivo.
Em um teste de 15 minutos, o aparelho da Google rodou mais de 10 minutos com clock reduzido de apenas 1,6 GHz — sendo que sua frequência de operação deveria ser 2,3 GHz. Considerando que estamos tratando de um chipset com mais de dois anos, dá para entender porque os demais componentes apresentaram resultados melhores, já que receberam várias melhorias e conseguem ter melhor controle sobre a energia e os componentes.
Entre os modelos de chips testados, o Snapdragon 801 é provavelmente o mais eficiente, já que sua frequência de operação se mantém intacta do começo ao fim. Ainda que não chegue em clocks tão altos como a versão 805, sua constância mostra que ele pode entregar uma experiência mais satisfatória ao usuário.
O Snapdragon 810 já é um caso mais complexo. Primeiro, devemos notar que ele não chega nem próximo do clock do 805, mas isso talvez nem seria um problema grave. Entretanto, sua incapacidade de manter o desempenho em determinado patamar é o que mais complica a vida do consumidor.
Em alguns casos, o Snapdragon 810 chegou a reduzir a frequência para baixo de 1 GHz (chango a rodar a 850 MHz). Nessas situações, contudo, o componente tenta aliviar a carga de trabalho ao repassar parte das atividades para os demais núcleos. Em tais casos, o benchmark marca o clock mais alto da CPU, mas é possível perceber que se trata apenas de um truque.
Ao ativar os núcleos LITTLE, que são voltados para tarefas mais básicas, o processador consegue respirar um pouco e logo em seguida ativa novamente os núcleos big, que entregam poder de processamento mais robusto, mas isso é uma tática que acaba causando impacto significativo. O processador raramente atinge sua frequência máxima. Decepcionante!
O Exynos 7420 sofre de problemas semelhantes, mas sua inconstância é muito menor. São raros os casos em que o componente da Samsung precisa apela para os núcleos LITTLE e em momento algum o clock cai abaixo de 1 GHz. Colocando os dois processadores top de linha num mesmo gráfico, fica claro que o Exynos dá um banho em desempenho.
O problema no dia a dia
No fim das contas, os testes técnicos apenas comprovam o que já havíamos visto em nossas análises. Os processadores da Samsung se mostram mais robustos e preparados tanto em questão de performance quanto no gerenciamento de energia.
O grande xis da questão é que os componentes da Qualcomm já estão instalados em vários aparelhos e devem incomodar vários consumidores. Dificilmente uma atualização de software poderá corrigir esse tipo de problema e quem pagará pelo pato será o consumidor. Esperamos que esse tipo de mancada não se repita na próxima linha de chips da fabricante.